Certa vez em Brasília, o arquiteto Oscar Niemeyer, conversando com o artista plástico Omar Franco,
perguntou: "O que fazem vocês aqui que não enchem esta cidade com obras de arte?"
Desconcertado com a questão inesperada, Omar arriscou alguns comentários sobre a rigidez devida
ao tombamento de Brasília pela Unesco e a conversa ficou suspensa, ainda hoje mal resolvida.
Este é um assunto recorrente na Capital da República sempre que se pensa nos grandes espaços urbanos
e quanto perde a cidade por deixar de ocupá-los com obras de arte. Ainda nos últimos dias, o Correio Braziliense publicou
artigo de uma cronista local, sempre bem sintonizada com a cidade, Conceição de Freitas, lembrando o entusiasmo que o crítico
Mário Pedrosa mantinha pela nova capital construída no Planalto Central. Dele, recolheu uma frase sobre Brasília, que, na
sua opinião, significava, "em síntese, uma cidade que se constrói".
Acho que esse sentimento explica, de alguma maneira, a ação desencadeada, neste sábado, dia
12 de abril de 2003, na Praça 21 de Abril, às margens da Avenida W-3 sul, principal artéria da Capital, onde um grupo de mosaicistas
locais ergueu e fixou dois totens, lado a lado, junto ao ponto de ônibus, com imagens referentes à paz e à harmonia
entre os povos.
A obra resultou de uma oficina que promovi nos últimos dias no Espaço Cultural da 508 sul, integrando
diversos companheiros em torno de um projeto, que recebeu a assinatura coletiva de "Loucos de pedra". Cada um dos participantes
trouxe suas tesselas em vidro, cerâmica, azulejos, mármores, granitos, pedras duras, seixos rolados, e outros artefatos, integrando-os
todos de forma harmônica e de beleza indescritível.
Para tanto, foram utilizadas duas armações de ferro pré-existentes no local, erguidas há cerca de
dez anos, e que serviam, outrora, para indicar o trajeto dos ônibus pela cidade. Com o tempo, o painel deixou de ser atualizado
e passou a servir para colocação de papéis adesivos com finalidade comercial, fazendo uma sujeira danada nas peças.
Desta vez, os "loucos de pedra" presentearam a cidade com as duas obras, embelezando a estrutura
e deixando preservada a face contrária, deixando-a livre, caso se queira ainda resgatar as armações de ferro com as indicações
de trajetos dos ônibus.
A Oficina ainda não terminou. Vai continuar nos próximos dias realizando trabalhos em mosaico para
colocação em calçadas, dando recados sobre a paz e servindo para consertar áreas danificadas do piso da rua. Uma experiência
importantíssima de intervenção urbana, na qual o mosaico entra não propriamente como o fim, mas como o meio, ou seja, como
a linguagem empregada para cumprir o objetivo de apropriação da área pública de uma forma digna e elevada, coerente com a
cidade e com seu desejo permanente de reconstrução.